sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Resenha - A Formação das Almas


José Murilo de Carvalho possui pós-doutorado em duas universidades: na de Stanford, nos Estados Unidos, e na de Londres. Membro da Academia Brasileira de Ciências, o historiador tem uma trajetória profissional em diversas instituições de pesquisa, no Brasil e no exterior, como, por exemplo, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na École des Hautes Études em Sciences Sociales, no Instituto de Estudos Avançados de Princeton, e nas Universidades de Londres, Oxford, Stanford, Califórnia (Irvine) e Leiden (Holanda). Atualmente, leciona na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde é professor do Departamento de História. No que tange a sua obra, José Murilo de Carvalho conta com diversos livros publicados, entre eles “Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi”, “Cidadania no Brasil: o longo caminho”, “A construção da ordem: a elite política imperial”, “A formação das almas: o imaginário da República no Brasil” e “Teatro de sombras: a política imperial”.
José Murilo de Carvalho não foi o único a escrever obras dentro dessa temática, de “A Formação das Almas”, existem vários autores que compuseram uma historiografia ampla sobre o assunto, e que foram utilizados por Carvalho na construção de seu livro. Dessa historiografia destacamos: Raoul Girardet, Paulo Miceli e Suely Robles Reis de Queiroz. Carvalho manteve um diálogo constante com esses autores.
Em sua obra “Mitos Mitologias e Políticas”, de 1987, Girardet discute sobre a criação e importância dos mitos, e sua importante relação com a política. Carvalho também faz essa relação entre os mitos e a política. Paulo Miceli, em “O Mito do Herói Nacional”, de 1988, discorre acerca da criação e manipulação do herói da pátria. Carvalho faz uma análise semelhante em a “A Formação da Alma”. Queiroz, em obra intitulada “Os Radicais da república. Jacobinismo: idéia e ação, 1893-1897”, de 1986, faz uma análise do pensamento político dessa corrente republicana, nesse período. Análise semelhante faz Carvalho na obra em pauta, mostrando não só o pensamento político dos jacobinos, como o das outras correntes republicanas.
O que dizem sobre a história de um país os monumentos erguidos em praça pública? Ou as bandeiras e hinos nacionais? Ou, ainda, caricaturas e charges tiradas das páginas de um jornal? José Murilo de Carvalho mostra como esse material pode ser de grande utilidade para se decifrar à mitologia e a simbologia de um sistema político. Por meio de imagens, o autor nos oferece um curioso passeio pelo momento de implantação do regime republicano. Entre texto e ilustrações, aprendemos como os mitos de origem criados para a República, seus heróis, a bandeira verde-amarela e o nosso hino traduzem as batalhas travadas pela construção de um rosto para a República brasileira.
As batalhas de símbolos e alegorias, parte integrante das batalhas ideológicas e políticas. Tratava-se de uma batalha em torno da imagem de um novo regime, cuja finalidade era atingir o imaginário popular, para recriá-lo dentro dos valores republicanos. Essa batalha é o tema central de “A Formação das Almas”. O autor mostra que símbolos e mitos por seu caráter difuso, por sua leitura menos codificada, tornam-se elementos poderosos de projeção de interesse, aspirações e medos coletivos. Na medida em que tenham êxito em atingir o imaginário, podem também plasmar visões de mundo e modelar condutas.
José Murilo de Carvalho, mostra de forma clara e objetiva as batalhas travadas pelos jacobinos, liberais e positivistas na criação dos hinos nacionais, das bandeiras, dos heróis e dos mitos da criação da república. Como essas correntes influenciadas pelos americanos e pelos franceses, tentaram de toda forma ganhar o imaginário social, através de ideologias e utopias. Carvalho discute a fundo o conteúdo de alguns dos principais símbolos utilizados pelos republicanos brasileiros e, na medida do possível, avalia sua aceitação ou não pelo público a que se destinava, isto é, sua eficácia em promover a legitimação do novo regime.
Justifica a discussão dos símbolos e seu conteúdo, pois segundo ele, essa discussão poderá fornecer elementos preciosos para entendermos a visão de república que lhes estava por trás, ou mesmo a visão de sociedade, de história e do próprio ser humano. Essa discussão pode ser particularmente importante para revelar as divergências e os conflitos entre as distintas concepções de república então presente. Partindo do pressuposto de que a aceitação ou rejeição dos símbolos propostos poderá revelar as raízes republicanas preexistente no imaginário popular e a capacidade dos manipuladores de símbolos de refazer esse imaginário de acordo com os novos valores. Segundo Carvalho, a aceitação desses símbolos e sua eficácia política dependem da existência de uma comunidade de imaginação, ou comunidade de sentido. Inexistindo esse terreno comum, que terá sua origem no imaginário preexistente, a relação de significado não se estabelece e o símbolo cai no vazio, se não no ridículo, como aconteceu com a representação feminina da república, por exemplo.   
O livro “A Formação das Almas”, de José Murilo de Carvalho, contém 166 páginas, divididas em agradecimentos, introdução, cinco capítulos que estão subdivididos em tópicos, onde discorre sobre sua fundamentação teórica, notas, fontes e índices das ilustrações.
No início, faz seus agradecimentos a seus colaboradores. Introduz mostrando seus objetivos, suas idéias principais, suas justificativas e pressupostos já comentados nessa resenha. No primeiro capítulo o autor discute as diferentes idéias de liberdade dos republicanos, seus desejos e utopias para a nova república, a herança imperial e sua influência na república e o conceito de cidadania e estadania. No segundo capítulo é discutido o mito de origem da república de acordo com os interesses de cada corrente e personificado nas pessoas de Deodoro (república militar), Benjamin Constant (república sociocrática) e Quintino Bocaiúva(república liberal). O terceiro capítulo trata-se do mito do herói, sua criação e manipulação de acordo com os desejos dos formadores do imaginário. Mostra Tiradentes, covarde e herói, vilão e salvador, religioso e revolucionário, tudo de acordo com os interesses das correntes republicanas, e porque Tiradentes foi nacionalmente aceito como herói da pátria. No quarto capítulo discute a tentativa da representação feminina da república. Como a aceitação do símbolo na França e a rejeição no Brasil permitem mediante a comparação por contraste, esclarecer aspectos das duas sociedades e das duas repúblicas. No quinto capítulo discute a tentativa de criação e modificação da bandeira e do hino nacional, o peso da herança da tradição imperial na formação desses símbolos. O último capítulo é dedicado aos positivistas ortodoxos, por ter sido eles os maiores manipuladores de símbolos do novo regime.
Para a elaboração dessa obra, José Murilo de Carvalho utilizou uma bibliografia ampla e diversificada. Utilizou outras obras sua como, “Os bestializados”, e obras de autores brasileiros e estrangeiros. Também utilizou vários jornais e revistas da época, como: O Cruzeiro, O Paiz, O Mequetrefe, Revistas do IHGB, Revista do Brasil etc. Utilizou ainda vários artigos teses e folhetos. Por fim trabalhou com várias ilustrações retiradas de revistas, jornais monumentos e museus. Esses recursos foram utilizados pelo autor em sua fundamentação teórica para provar suas teses, justificar seus pressupostos e resolver a problemática por ele proposta. Ou seja, a partir de todo esse acervo, documentação e ilustração, ele faz uma análise da república a partir do imaginário. Para isso ele utiliza uma linguagem simples e objetiva, facilitando a leitura, além de utilizar várias ilustrações que facilitam a abstração.
De acordo com a investigação feita pelo autor em livros e documentos que se propôs a estudar, eu acho que o resultado obtido foi bem positivo, uma vez que, cumpriu seus objetivos. O livro é muito esclarecedor a cerca da criação dos nossos símbolos e mitos. É muito relevante e indicado para alunos que queiram conhecer a criação do imaginário da nossa república, pois sem conhecer a origem dos nossos símbolos e mitos, se torna difícil entender a criação da república brasileira.
Apesar da relevância já citada acima, eu penso que o livro é reduzido em argumentos, uma vez que, como sabemos, cada capítulo desse livro, para ser bem debatido e investigado, merece um livro a parte. Cada capítulo é digno de um livro. Mas não é esse o objetivo do autor. 


BIBLIOGRAFIA:
CARVALHO, José Murilo. A Formação das Almas: o imaginário da república do Brasil. 7ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. 166p.

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